
Programa - Comunicação Oral - CO18.1 - Saúde Mental, Sofrimento Social e Escuta das Juventudes
30 DE NOVEMBRO | DOMINGO
15:00 - 16:30
15:00 - 16:30
"O QUE MATA MESMO É A FALTA DE LIBERDADE"
Comunicação Oral
1 UFPR
Apresentação/Introdução
A internação, prevista no ECA e regulamentada pelo Sinase, é a medida mais severa imposta a adolescentes autores de ato infracional. Embora devesse ser breve e excepcional, pode durar até três anos. Nesse período, rotinas rígidas e ausência de vínculos afetam a saúde mental, especialmente em uma fase de intensas transformações subjetivas.
Objetivos
O estudo analisou as vivências de adolescentes em privação de liberdade no Paraná, com ênfase nos efeitos da institucionalização na saúde mental, na rotina, nas estratégias de enfrentamento e na forma como o sofrimento é manejado.
Metodologia
Trata-se de um estudo qualitativo, transversal e observacional, vinculado ao projeto “Ambiência e manejo do adolescente privado de liberdade”, com foco nas entrevistas realizadas com adolescentes em unidades socioeducativas. A coleta ocorreu entre maio e julho de 2024, com roteiro semiestruturado que abordou trajetórias de vida, rotina institucional, sofrimento psíquico e estratégias de enfrentamento. A análise baseou-se na fenomenologia, na hermenêutica e no paradigma psicossocial, visando compreender os sentidos atribuídos pelos adolescentes à privação de liberdade e seus efeitos sobre a saúde mental.
Resultados
A partir das narrativas dos adolescentes, percebe-se que a privação de liberdade afeta intensamente a saúde mental. Relatam tristeza, ansiedade, culpa, solidão e sofrimento psíquico agravado pela rotina rígida, ausência de escuta e medicalização excessiva ou negligente. A autolesão, o uso de psicotrópicos e o silêncio surgem como estratégias de enfrentamento, enquanto o cuidado entre pares aparece como alternativa afetiva. O manejo institucional é percebido como vigilância e controle, e não como acolhimento, gerando desconfiança e silenciamento.
Conclusões/Considerações
Conclui-se que o sistema socioeducativo, ao privilegiar a medicalização e o controle disciplinar, contribui para o agravamento do sofrimento psíquico de adolescentes privados de liberdade. As experiências relatadas apontam para a urgência de práticas pautadas na escuta, no cuidado integral e no reconhecimento da singularidade dos sujeitos, rompendo com lógicas punitivas e moralizadoras que silenciam e invisibilizam as dimensões sociais da dor.
IDEIA SADIA: GRUPO DE JOVENS NA INTERNAÇÃO RESTRITA
Comunicação Oral
1 SEJUS
2 UCB
Período de Realização
De abril de 2023 a Dezembro de 2025
Objeto da experiência
Socioeducadores e adolescentes que estão cumprindo medida socioeducativa em uma unidade de internação restrita (2 profissionais e 8 jovens por grupo)
Objetivos
Proporcionar trocas de experiência entre jovens e socioeducadores sobre temas de educação em direitos humanos e promoção da saúde em uma unidade de internação restrita.
Estimular trocas dialógicas e fomento a construção crítica do conhecimento entre os sujeitos da comunidade socioeducativa
Metodologia
Foram formados coletivos com participação ativa de adolescentes cumprindo medida socioeducativa em uma unidade de internação restrita que funcionam no contraturno escolar de forma quinzenal. Os grupos intitulados “Ideia Sadia” foram nomeados pelos participantes que também votam nos temas a serem debatidos e escolhem as metodologias ativas a serem desenvolvidas em cada encontro. Esses debatem temas sobre saúde na concepção ampliada, na diversidade de assuntos de interesse dos jovens.
Resultados
Já foram abordados temas como amor; rejeição; uso, abuso e dependência de substâncias psicoativas; justiça; cultura periférica; esperança; trabalho; escolarização; racismo; tatuagem; alimentação; prática de exercícios físicos; masculinidade, entre outros, espaços esses em que os jovens escolhem convidados, filmes, documentários, elaboram músicas, desenhos, e utilizam tecnologias diversas para fomento a expressão artística e de opinião crítica.
Análise Crítica
É um desafio compreender a realidade dos jovens e fazer trocas de saberes de forma horizontal em um espaço institucional disciplinar. A Política Nacional de Educação Popular em Saúde nos orienta para uma ética militante e profissional comprometida com o usuário da política da socioeducação. O diálogo, a problematização, as mediações para emancipação, a construção compartilhada do conhecimento traz reflexões sobre novas formas de socialização com menos violência que inspiram novos projetos de futuro.
Conclusões e/ou Recomendações
Os coletivos de jovens constroem contra hegemonia por constituir espaços formativos embasados nos saberes dos jovens negros periféricos que renovam as práticas institucionais com criatividade. Essas dinâmicas criam fissuras nas hegemonias da cultura punitivista vigente. São momentos esses, que expressam liberdade e permitem a produção de saúde e expressão da vida.
UM GRUPO DE CO-PESQUISADORAS: REFLEXÕES SOBRE A PRODUÇÃO DE UMA PESQUISA PARTICIPATIVA COM ADOLESCENTES SOBRE AUTOMUTILAÇÃO E CUIDADO
Comunicação Oral
1 IMS/UERJ
Período de Realização
Este resumo abarca o trabalho com o grupo realizado entre outubro de 2024 e maio de 2025.
Objeto da experiência
O trabalho com um grupo consultivo de adolescentes em uma escola pública como parte de uma pesquisa de doutorado sobre automutilação e cuidado.
Objetivos
Criar um espaço colaborativo de construção metodológica da pesquisa com adolescentes, visando: refletir sobre um espaço de pesquisa ético e seguro em seus termos; elaborar estratégias de abordagem dos participantes e revisar os instrumentos de produção de dados.
Descrição da experiência
O grupo de co-pesquisadoras, como nomeamos, foi constituído a partir de indicações da direção da escola, e, depois, de uma professora e das próprias adolescentes já envolvidas, que trouxeram amigas para o grupo. Foram realizados 25 encontros e, ao longo do processo, 12 adolescentes atuaram como co-pesquisadoras. As atividades envolveram principalmente conversas, produções artísticas e jogos — formas de expressão preferidas pelas próprias adolescentes.
Resultados
O trabalho com as co-pesquisadoras mostrou-se relevante no desenvolvimento de instrumentos de produção de dados mais adequados às formas como os adolescentes vivem e se expressam. Além disso, foi possível desmitificar alguns dos receios relacionados ao falar sobre automutilação com esse público. O diálogo sobre o tema com as co-pesquisadoras não gerou efeitos negativos aparentes, pelo contrário, observou-se uma disposição para a escuta e a reflexão crítica sobre o tema.
Aprendizado e análise crítica
Esse processo trouxe maior segurança e afinamento ético-metodológico para a realização do campo de pesquisa. No entanto, também evidenciou limites e tensões, como: dificuldades de conciliação com o tempo e o ritmo da escola; entraves por parte das figuras parentais; e necessidade de manejo de expectativas, interesses e desinteresses das co‑pesquisadoras. Esses desafios exigiram negociação contínua entre os atores envolvidos, reconhecendo seus diferentes papéis e formas de envolvimento.
Conclusões e/ou Recomendações
A participação da comunidade nos processos e decisões das políticas de saúde é um dos pilares do SUS. No entanto, a participação de crianças e adolescentes ainda é limitada, reflexo de uma visão que os percebe como incapazes ou imaturos. Esta experiência tensiona esse modelo ao afirmar que proteção e participação não são contraditórias, mas podem caminhar juntas — desde que pautadas pelos termos e formas de engajamento dos próprios adolescentes.
SOFRIMENTO PSÍQUICO E RISCO DE SUICÍDIO EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES: CARTOGRAFIA DAS PRÁTICAS DE CUIDADO NOS TERRITÓRIOS DA SAÚDE E DA EDUCAÇÃO EM CAMAÇARI-BA
Comunicação Oral
1 EBMSP
Apresentação/Introdução
O sofrimento psíquico de crianças e adolescentes tem se intensificado nas últimas décadas, com o aumento de emergências psíquicas e comportamentos suicidas. Este estudo parte da urgência de compreender como profissionais da saúde e da educação manejam esse sofrimento nos territórios, diante de discursos fragmentados e da invisibilidade dos determinantes sociais da infância e da adolescência.
Objetivos
Cartografar práticas e sentidos construídos por profissionais da saúde e da educação frente ao sofrimento psíquico e ao comportamento suicida em crianças e adolescentes no município de Camaçari-BA, propondo estratégias intersetoriais de cuidado e formação.
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa qualitativa ancorada nos princípios da pesquisa-ação, com base em epistemologias críticas das ciências humanas. Foram realizados encontros formativos com 80 profissionais da Rede de Atenção Psicossocial, da Atenção Básica e da Educação Municipal de Camaçari-BA, utilizando oficinas, rodas de conversa e grupos focais. As análises dialogam com o Construcionismo Social, buscando compreender como os sentidos atribuídos ao sofrimento de crianças e adolescentes e ao suicídio impactam o cuidado e a gestão dos casos. As narrativas foram analisadas por meio da cartografia das práticas, com enfoque nos atravessamentos territoriais, institucionais e relacionais.
Resultados
As análises apontam a fragmentação entre saúde e educação no cuidado ao sofrimento psíquico e as dificuldades para reconhecer o suicídio como possibilidade na infância e na adolescência, além da ausência de dispositivos institucionais de suporte. As narrativas revelam a naturalização da desigualdade social e dos determinantes sociais do sofrimento psíquico. O dispositivo propiciou a criação de redes dialógicas entre saúde e educação, promovendo escuta, elaboração coletiva e estratégias de enfrentamento. Emergiram discussões sobre responsabilização familiar e desamparo institucional, além da urgência de políticas públicas intersetoriais e de cuidado territorializado para prevenir o suicídio.
Conclusões/Considerações
O sofrimento psíquico das crianças e adolescentes não pode ser reduzido a um fenômeno individual ou biomédico. Ele expressa dimensões históricas, sociais e afetivas do viver marcadas por exclusões e violências. A pesquisa aponta a necessidade de formação intersetorial para profissionais, valorizando os saberes do território e fortalecendo redes de cuidado. Reconhecer o suicídio como questão de saúde coletiva é fundamental para enfrentá-lo.
REDE PODE FALAR: TECENDO CAMINHOS PARA A ESCUTA ACOLHEDORA E PROMOÇÃO DO BEM-VIVER DE ADOLESCENTES E JOVENS
Comunicação Oral
1 Fiocruz
2 UFRPE
3 Unicef Brasil
4 Instituto Braços
5 UFS
6 UFRN
7 UEPB
8 UFAM
Período de Realização
A Rede Pode Falar vem sendo constituída, de forma permanente, desde 2020, e segue ativa.
Objeto da experiência
Necessidade de ações intersetoriais que ofertem escuta de jovens e contribuam para promoção do bem-viver, na perspectiva dos Direitos Humanos
Objetivos
Construir, de forma colaborativa e intersetorial, conhecimentos e intervenções voltados para a promoção do bem-viver e da saúde mental de adolescentes e jovens, bem como para a formulação de programas e políticas públicas juvenis.
Descrição da experiência
O canal Pode Falar foi criado em 2021 por meio da articulação do UNICEF Brasil com instituições com expertise em direitos dos jovens e especialistas em saúde e educação. A Rede é composta por 15 instituições, (13 universidades e 02 ONGs), contando com a participação de jovens, pesquisadores e universitários de diferentes áreas do conhecimento, tendo como pilares: canal de ajuda para jovens, produção de políticas públicas, geração de conhecimento, rede de adolescentes e formação profissional.
Resultados
Por meio do canal de ajuda Pode Falar foram acolhidos mais de 115 mil jovens. A rede também promoveu articulação com as políticas públicas dos territórios onde suas instituições estão localizadas. Além de seminários virtuais, reuniões estratégicas presenciais e produção de artigos e livro, a rede realizou conferências livres de saúde mental juvenis em cinco estados e elegeu a primeira delegação de adolescentes que participaram da V Conferência Nacional de Saúde Mental, em dezembro de 2023.
Aprendizado e análise crítica
A Rede Pode Falar vem se constituindo como um dispositivo potente para articulação de diferentes instituições, pessoas e saberes em prol da escuta e acolhimento, e incide na formação de profissionais como foco no cuidado humano, sensíveis à determinação social e às demandas dos jovens. A sustentabilidade da rede constitui-se como um dos principais desafios enfrentados e ampara-se na partir da construção coletiva de estratégias de financiamento e diálogos com o poder público federal.
Conclusões e/ou Recomendações
Diante dos desafios relacionados ao cuidado da saúde mental de jovens, a rede tem se constituído como uma estratégia pertinente para somar esforços e recursos, compartilhar saberes e trocar experiências. Dada a diversidade do grupo, a rede também vem se fortalecendo a partir da oferta de escuta e apoio aos jovens, que também se estendem aos gestores, profissionais de saúde e educação, pais e mães, e demais pessoas comprometidas com o tema.
“NINGUÉM SABE O QUE A GENTE PASSA”: INTERSECCIONANDO SOFRIMENTO SOCIAL E SAÚDE MENTAL ENTRE ADOLESCENTES DE COMUNIDADES PERIFÉRICAS
Comunicação Oral
1 UFMG
Apresentação/Introdução
O sofrimento social remete a compreensão da experiência do mal-estar e os processos sociais, políticos e culturais que o engendram e o constituem numa dor incrustada nas subjetividades. A racionalidade neoliberal promove a individualização dos problemas coletivos à medida que promove o sujeito a condição de empresário de si.
Objetivos
O objetivo do trabalho foi analisar aspectos e processos socioculturais que geram questões de saúde mental entre adolescentes de periferias urbanas e como são percebidos por eles.
Metodologia
Este trabalho emerge da revisitação do tema saúde mental em 110 entrevistas de adolescentes participantes de três pesquisas etnográficas realizadas em duas comunidades periféricas da cidade de São Paulo. Os instrumentos metodológicos utilizados foram observação e entrevistas em espaços de sociabilidade, escolas públicas e unidades básicas de saúde. Entre 2018 e 2020, desenvolvi um estudo sobre transição da infância para a adolescência. Este bairro também foi campo de um projeto sobre experiências juvenis na pandemia, em 2021 e 2022. A terceira investigação, em 2023, focava necessidades em saúde e o acesso juvenil a serviços de saúde. No total, foram 63 moças e 37 rapazes, de 11 a 19 anos.
Resultados
Se entre os mais novos prevalecem narrativas de “falta”, “vazio” e “dor” na relação com os pais, os de 18-19 anos ponderam o sofrimento e o estresse ocasionados pela pauperização e trabalho extenuante. A internalização da “pressão” dos pais foi a causa mais referida de “ansiedade” e “depressão”. Hesitações e incertezas corriqueiras na idade amalgamam-se à dimensão subjetiva do neoliberalismo. A “ansiedade” era gerada pelo “medo” de falhar na empreitada de produzir uma vida feliz. O imperativo de “amadurecer” e “aprender a se desenvolver” para “cuidar de mim mesmo” na fase adulta, evoca o discurso do empresário de si, que deve contornar adversidades e gerir uma série de “riscos” sociais.
Conclusões/Considerações
O atendimento psicológico foi apontado como principal necessidade em saúde de adolescentes. A expressão “ninguém sabe/entende o que a gente passa” ilustra a relevância do “apoio”, sintetizado na noção de “terapia” como processo dialógico de cuidado, cuja finalidade seria entender melhor as situações vividas e aprender a lidar com os desafios que se colocam.

Realização: