Programa - Comunicação Oral - CO8.1 - Direitos, territórios e Saúde: desafios e perspectivas contemporâneas
30 DE NOVEMBRO | DOMINGO
15:00 - 16:30
USO E DESCONTINUAÇÃO DA PREP ENTRE HOMENS QUE FAZEM SEXOM COM HOMENS, E PESSOAS TRANS E NÃO BINÁRIAS: IMPACTO DA HOMOFOBIA INTERNALIZADA E DA DISCRIMINAÇÃO
Comunicação Oral
Barreto, K. M.1, Torres, T. S.2, Freitas, L. A.2, Hoagland, B.2, Jalil, E. M.2, Veloso, V. G.2, Grinsztejn, B.2, Luz, P. M.2
1 ENSP, Fiocruz
2 INI-Fiocruz
Apresentação/Introdução
A profilaxia pré-exposição (PrEP) é uma estratégia altamente eficaz de prevenção do HIV, mas o uso e a continuidade entre gays e outros homens que fazem sexo com homens (HSH) e pessoas transgênero e não-binárias (TGNB) no Brasil continuam subótimos. Diversas são as Barreiras de acesso ou continuidade das estratégias de prevenção e podem ser de natureza individual, interpessoal, socioeconômica ou estrutural.
Objetivos
Avaliar a associação entre experiências de discriminação e a homonegatividade internalizada (HI) no uso e descontinuação da PrEP na população HSH e pessoas transgênero e não-binárias (TGNB) elegíveis ao uso da PrEP no Brasil em 2021/2022.
Metodologia
Os dados provêm de inquérito online conduzido de novembro/2021 a janeiro/2022, recrutando uma amostra de 2909 participantes HSH e pessoas TGNB ≥ 18 anos residentes no Brasil. A pesquisa avaliou HI (usando a Escala de Reações à Homossexualidade) e experiências de discriminação (usando a Escala de Discriminação Explícita) e conhecimento sobre HIV. O uso da PrEP foi avaliado com as opções “Nunca usei”, “Uso atual” e “Descontinuação”. Um modelo de regressão logística foi usado para estimar associações entre fatores e o resultado “uso atual” da PrEP em comparação com “nunca usei”, outro modelo considerou associações entre fatores e o resultado “descontinuação” em comparação com “uso atual”.
Resultados
Nos achados, 71,2% nunca usaram PrEP, 22,9% estavam em uso e 5,9% haviam descontinuado. O modelo ajustado para “uso atual” mostrou que pontuações mais altas de HI (aOR=0,87, IC de 95%=0,77-0,97) e pontuações mais altas de discriminação (aOR=0,91, IC de 95%=0,82-1,02) estavam associadas a menores chances de “uso atual”, enquanto pontuações mais altas de conhecimento sobre HIV (aOR=1,33, IC de 95%=1,17-1,52) estavam associadas a maiores chances de “uso atual”. O modelo para “descontinuação” mostrou que pontuações mais altas de HI (aOR=1,25, IC de 95%=1,03-1,51) e pontuações mais altas de discriminação (aOR=1,21, IC de 95%=1,01-1,44) estavam associadas a maiores chances de “descontinuação”.
Conclusões/Considerações
Nossos achados sugerem que uma abordagem integrada que aborde fatores psicossociais além das barreiras práticas é necessária para aumentar o uso e continuação da PrEP. Intervenções de saúde pública para reduzir o estigma e a discriminação dentro das comunidades e ambientes de saúde são necessárias, juntamente com intervenções em nível individual para aumentar a autoaceitação e capacitar os indivíduos a navegar por experiências discriminatórias.
OBESIDADE, INSEGURANÇA ALIMENTAR E QUESTÕES DE GÊNERO E RAÇA/COR: DADOS DO INQSAN-SEMIÁRIDO
Comunicação Oral
Brito, R. C. S.1, Gomes, S. M. B.2, Santos, A. B. M. V.3, Palmeira, P. A.4
1 Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (PPGSCOL/UFRN); Núcleo de Pesquisa e Estudos em Nutrição e Saúde Coletiva (Núcleo PENSO/UFCG)
2 Programa de Pós-Graduação em Ciências da Nutrição (PPGCN/UFPB); Núcleo de Pesquisa e Estudos em Nutrição e Saúde Coletiva (Núcleo PENSO/UFCG)
3 Núcleo de Pesquisa e Estudos em Nutrição e Saúde Coletiva (Núcleo PENSO/UFCG)
4 Programa de Pós-Graduação em Ciências da Nutrição (PPGCN/UFPB); Coordenação do Núcleo de Pesquisa e Estudos em Nutrição e Saúde Coletiva (Núcleo PENSO/UFCG)
Apresentação/Introdução
O semiárido nordestino, com altos índices de insegurança alimentar (IA), exemplifica a complexidade das vulnerabilidades brasileiras, onde clima, pobreza, racismo, desigualdades de gênero e de territórios convergem e se retroalimentam, sustentadas por sistemas alimentares degradantes, práticas econômicas desiguais e políticas públicas fragmentadas, que caracterizam a sindemia global.
Objetivos
Analisar, sob a perspectiva interseccional, como gênero e raça/cor estão associadas às condições de obesidade e IA em uma região de alta vulnerabilidade social.
Metodologia
Estudo transversal de base populacional realizado em áreas urbana e rural de dois municípios do semiárido nordestino (Cuité/PB e Santa Cruz/RN), com amostragem estratificada e ponderação por expansão. A coleta envolveu 683 adultos (18–59 anos), com aferição antropométrica, aplicação da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) e questionário socioeconômico via KoboToolbox. A variável de desfecho foi a obesidade (IMC ≥30 kg/m²), e a interseccionalidade foi categorizada conforme gênero e raça/cor (homem branco, homem negro, mulher branca, mulher negra). Foram realizadas análises descritivas e Regressão de Poisson com ajuste para plano amostral.
Resultados
A obesidade teve prevalência semelhante entre homens (31,8%) e mulheres (31,5%), sem diferenças significativas por raça/cor. Contudo, análises interseccionais mostraram que mulheres negras apresentaram maior risco de obesidade, especialmente na exposição à IA. A IA moderada/grave foi mais prevalente entre mulheres (26,9%) e, sobretudo, entre mulheres negras (26,2%). Modelos de regressão revelaram associação significativa entre IA e obesidade entre mulheres, mas não entre homens, indicando vulnerabilidade específica. Já entre negros(as), o risco de obesidade foi maior entre as mulheres, independentemente da IA.
Conclusões/Considerações
A obesidade incide de forma desigual sobre mulheres negras em situação de IA, evidenciando a sobreposição de vulnerabilidades sociais. Fatores como pobreza, baixa escolaridade e informalidade do trabalho, predominantes neste grupo, intensificam os riscos nutricionais. Superar esse cenário exige o fortalecimento de sistemas e políticas públicas intersetoriais, sensíveis ao território, focado em ações afirmativas para equidade de gênero e raça/cor.
TENSIONANDO DINÂMICAS URBANAS E COLONIAIS A PARTIR DOS POVOS DO CAMPO: UMA CARTOGRAFIA DE SABERES E PRÁTICAS DE CUIDADO À SAÚDE NO COTIDIANO
Comunicação Oral
Brandão, F. J. C.1, Penido, C. M. F.1
1 UFMG
Apresentação/Introdução
Os povos do campo convivem historicamente com a exclusão, com a falta de políticas públicas e também com a imposição de modos de cuidar da saúde. O debate sobre a saúde ainda é urbano e etnocêntrico e não abrange contextos diversos. As epistemologias da cidade produzem práticas profissionais alheias aos modos de vida rurais, impondo modos de vida universais e desapropriando saberes locais.
Objetivos
Mapear as dinâmicas de cuidado à saúde junto aos moradores da localidade Massangano, em Belo Vale/MG, evidenciando saberes locais, resistências e linhas de fuga que tensionam a hegemonia biomédica e urbanocêntrica nas políticas e práticas de saúde.
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa-intervenção cartográfica, que fez uso de oficinas e do diário de campo como dispositivos de cultivo de dados. Os dispositivos são compreendidos como máquinas que criam conexões entre componentes heterogêneos em um circuito provisório, sendo capazes de produzir regimes de enunciação, de visibilidade e de subjetivação. As oficinas foram utilizadas como espaços de coprodução entre pesquisador e moradores acerca do cuidado à saúde e construídas a partir de perguntas e propostas-disparadoras: como vivem no lugar onde moram?; Vamos construir um mapa de Massangano?; O que é saúde para vocês? Como vocês cuidam da saúde onde vivem?; Como vocês imaginam Massangano no futuro?
Resultados
Identificaram-se múltiplas formas de cuidado tecidas a partir de vínculos familiares, práticas religiosas e saberes da terra. A fé mobiliza práticas de cuidado que atravessam gerações, enquanto os quintais se firmam como territórios de cuidado envolvendo uma multiplicidade de vidas. As relações comunitárias e a solidariedade emergem como resposta ao abandono estatal, construindo redes de pertencimento. As experiências cotidianas revelam tensões com a racionalidade técnica urbana e biomédica, indicando modos de vida que produzem saúde também como resistência à homogeneização e à invisibilidade impostas pela colonialidade/urbanidade, muitas vezes institucionalizada nas políticas de saúde.
Conclusões/Considerações
Os saberes e práticas de saúde em Massangano desestabilizam lógicas coloniais e universalistas ao evidenciar um cuidado enraizado em territórios e afetos. A escuta dessas experiências indica a urgência de políticas públicas que reconheçam a diversidade epistêmica e promovam encontros éticos entre serviços e populações do campo. A decolonialidade em saúde exige práticas que deem passagem à singularidade e à potência dos modos de vida rurais.
JUVENTUDES, TERRITÓRIOS DE (RE)EXISTÊNCIAS E CUIDADOS EM SAÚDE
Comunicação Oral
Oliveira, S.K.L1, Alves, J.H1
1 UFF
Apresentação/Introdução
Os territórios periféricos urbanos são tantas vezes reduzidos a experiências de violência e ausência de políticas públicas vivenciadas por seus moradores, em especial pela juventude, que tendem a limitar o debate sobre condições de vida e saúde. Cientes da potência de existir e resistir de seus habitantes, convocamos a juventude negra para dialogar sobre produção de cuidado e territorialidade.
Objetivos
Neste trabalho, buscamos compreender como as vivências de jovens negros, de 18 a 29 anos, em seus territórios de (re)existência, acionam dispositivos de cuidado à saúde face a algumas das lacunas do Estado.
Metodologia
Para tanto, de julho a setembro de 2024, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com três jovens negras, localizadas a partir da estratégia de busca bola de neve, onde um participante indica outro, a partir de sua rede relacional. As participantes são residentes e membros de coletivos sociais do território periférico da Maré, na cidade do Rio de Janeiro. As entrevistas foram categorizadas em eixos de análise, e analisadas em profundidade à luz da Análise Temática. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética, protocolo 75290423.1.0000.5243/2024.
Resultados
Os resultados das análises revelaram que a coletividade, construída de diferentes formas e por distintas necessidades, torna-se um anteparo às mazelas cotidianas que atravessam os territórios periféricos e os corpos de jovens negros. Assim, torna-se um dispositivo de cuidado e, portanto, de saúde, pautado em uma profunda relação com o território e com a territorialidade. Racismo e homofobia tencionam os modos de viver e de ser entre jovens, assim, demandam estratégias singulares de cuidado em conexão com o território.
Conclusões/Considerações
A territorialidade se mostrou uma importante via de acesso para a compreensão de como a coletividade, enquanto dispositivo de cuidado e saúde, opera nos territórios de periferia e entre os jovens negros. Partilhar de particularidades territoriais contribui para a formação identitária, localizando o sujeito no mundo e, pensando em jovens negros periféricos, fortalece-os diante de atravessamentos potencialmente adoecedores.