
Programa - Comunicação Oral - CO35.2 - Corpos Invisibilizados, vozes emergentes: interseccionalidades e violências estruturais na saúde
01 DE DEZEMBRO | SEGUNDA-FEIRA
15:00 - 16:30
15:00 - 16:30
DECIDIR COM VOZES NEGRAS: ADAPTAÇÃO DE UMA PLATAFORMA DIGITAL DE PLANEJAMENTO DE SEGURANÇA PARA MULHERES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DE GÊNERO SOB PERSPECTIVA INTERSECCIONAL
Comunicação Oral
1 UFPR
2 UFMS
3 Emory University, Atlanta,
4 USP
Apresentação/Introdução
A violência por parceiro íntimo (VPI) contra mulheres é intensificada por múltiplas formas de opressão, como o racismo, sexismo e desigualdades socioeconómicas. Essas opressões interseccionais, frequentemente invisibilizadas por tecnologias digitais, criam uma realidade mais complexa para as mulheres negras, que enfrentam maiores dificuldades em romper ciclos de violência e em encontrar apoio.
Objetivos
Adaptar a plataforma Eu Decido (versão 1.0) às necessidades de mulheres negras a partir do relato de usuárias e profissionais da Atenção Primária à Saúde (APS) de Paranaguá/PR.
Metodologia
Pesquisa qualitativa com profissionais e 10 mulheres negras usuárias e da Atenção Primária à Saúde (APS) de Paranaguá/PR, de junho a setembro de 2025. Estão sendo realizadas entrevistas semiestruturadas e grupos focais para investigar as necessidades de mulheres negras em relação ao enfrentamento da VPI com base na versão 1.0. A coleta de dados é seguida da análise de conteúdo temática e um comitê consultivo do projeto, formado por mulheres de diferentes segmentos sociais (raça, classe, território, faixa etária) auxiliará a equipe interdisciplinar na incorporação dos resultados na reformulação do aplicativo, seguida de teste piloto para avaliar usabilidade e aceitabilidade.
Resultados
A versão protótipo do aplicativo Eu Decido (1.0) foi desenvolvida entre 2021-2023 sem considerar especificidades de mulheres negras. Desde 2025, um comitê consultivo composto por mulheres de diferentes faixas etárias, territórios e trajetórias vem orientando a adaptação do app. Foi elaborado roteiro de entrevistas e grupos focais adaptado para captar vivências racializadas. A amostra vem sendo ampliada com ênfase em diversidade de contextos. As análises preliminares revelam demandas por acessibilidade offline, comunicação não-hegemonizada e integração eficiente com a rede de proteção.
Conclusões/Considerações
A adaptação do Eu-Decido representa uma estratégia para acolher e fortalecer mulheres negras vítimas de VPI, ampliando seu protagonismo e acesso a suporte em saúde e segurança. Na próxima etapa do estudo, será realizado um estudo longitudinal com mulheres brasileiras, avaliando a segurança, aceitação e efetividade do app, com meta de recrutamento e inclusão de mulheres negras como parte significativa das participantes.
VIOLÊNCIA CONTRA PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RUA EM BELO HORIZONTE
Comunicação Oral
1 Universidade Federal de Minas Gerais
Apresentação/Introdução
A violência se intensifica em contextos de desigualdade e negação de direitos. Estar em situação de rua implica enfrentar múltiplas opressões, marcadas pela invisibilidade, exclusão social e estigmas, que ampliam a vulnerabilidade das pessoas e evidenciam desigualdades estruturais sustentadas por relações de poder desiguais e valores discriminatórios.
Objetivos
Descrever os tipos de violência enfrentadas por pessoas em situação de rua em Belo Horizonte, Minas Gerais.
Metodologia
Trata-se de estudo transversal, realizado em espaços de uso da população em situação de rua de Belo Horizonte/MG. Foram entrevistadas pessoas em situação de rua maiores de 18 anos de idade, em situação de rua por pelo menos um mês. Para a coleta de dados foi utilizado questionário estruturado dividido em dados sociodemográficos, condições de vida e tipos de violência. A coleta ocorreu entre fevereiro e maio de 2025. O banco de dados foi organizado no programa excel 2019. Foram utilizadas estatísticas descritivas, com apresentação de frequências absolutas e relativas para caracterização do público. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais.
Resultados
Foram coletados dados de 251 pessoas, a maioria do sexo masculino (85,26%), com idade entre 30-39 anos (31,08%), pretas e pardas (82,86%), cisgênero (98,41%), heterossexual (89,64%) e escolaridade até ensino fundamental incompleto (34,66%). Relataram ter sofrido violência interpessoal ou coletiva (90,84%), dentre elas 88,05% sofreram violência psicológica e 72,51% violência física. Relataram ter sofrido algum tipo de violência estrutural 84,86% e violência autoinfligida 36,65%. Os principais agressores foram outras pessoas em situação de rua (66,53%), seguidos por agentes de segurança pública (41,83%). Os espaços públicos concentraram a maior parte dos relatos de violência (83,67%).
Conclusões/Considerações
A presente análise evidencia um contexto de múltiplas violências enfrentadas pelas pessoas em situação de rua, com caráter individual e estrutural. A alta prevalência de violência aliada à negação de direitos básicos e discriminações evidencia a urgência de políticas públicas que reconheçam as particularidades dessas vivências e atuem de forma intersetorial para a garantia da dignidade humana.
EXPRESSÕES SUBJETIVAS DA RACIALIZAÇÃO DO CORPO NO ATENDIMENTO A MENINAS NEGRAS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA SEXUAL: UMA QUESTÃO SOCIAL!
Comunicação Oral
1 Associação Comunitária Monte Azul
Apresentação/Introdução
As violências sexuais contra crianças e adolescentes possuem um caráter relacional e social, marcadas por moralismos, preconceitos e tabus. São, portanto, expressões da questão social que exigem uma abordagem do serviço social, com vistas a compreender como essas expressões se manifestam nos sujeitos e a intervir na construção de estratégias e recursos de acolhimento.
Objetivos
Apresentar como as expressões da racialização e do racismo se manifestam durante atendimentos sócio-individuais a crianças e adolescentes vítimas de violência sexual.
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa, baseada em fonte documental e de caráter descritivo-exploratório, que considerou as expressões da questão social ao longo do atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, realizado por uma equipe multidisciplinar de saúde na zona sul da cidade de São Paulo. A coleta de dados ocorreu por meio de análise rigorosa das evoluções de prontuários e das anotações dos profissionais durante o acompanhamento em saúde mental. Participou do estudo uma paciente, menina negra, vítima de violência sexual perpetrada por um homem, que esteve em atendimentos sócio-individuais por mais de um ano.
Resultados
Destaca-se, nos registros do prontuário de Dadá (9 anos), o momento em que ela reflete sobre sua intimidade, associando-a à sua identidade de menina negra. Ela acolhe a proposta da leitura de uma literatura infantil afrocentrada e inicia uma reflexão crítica ao questionar a naturalização com que as pessoas tocam seu cabelo. Passa a distinguir os toques que lhe agradavam — como os de sua mãe e irmã, ao trançarem seus cabelos — daqueles que ocorriam sem sua permissão. Dadá compreende como essas invasões atingem sua intimidade, reflexão que foi validada pela literatura acessada. Tal experiência a fortaleceu e possibilitou o reconhecendo sua intimidade, como parte de seus direitos sociais.
Conclusões/Considerações
A pesquisa evidenciou a racialização e o racismo como expressões da questão social que emergiram no contexto dos atendimentos sócio-individuais. Destacou-se a interseccionalidade de categorias sociais como gênero e raça, e como estas impactam os sujeitos de forma singular. Tais aspectos exigem do assistente social uma abordagem que considere as subjetividades dos usuários, diretamente articuladas às expressões da questão social.
VIOLÊNCIAS, MASCULINIDADES E VIGILÂNCIA EM SAÚDE: UM OLHAR CRÍTICO SOBRE AS INTERNAÇÕES POR CAUSAS EXTERNAS NO CEARÁ (2015–2024)
Comunicação Oral
1 UECE
Apresentação/Introdução
As causas externas representam uma das principais manifestações da violência de gênero no campo da saúde, especialmente quando analisados sob a perspectiva das masculinidades. No Ceará, a prevalência de homens nas internações evidencia como os padrões sociais, culturais e simbólicos influenciam nas práticas de riscos, rejeição ao autocuidado e negligência frente a proteção individual e coletiva.
Objetivos
Analisar as caraterísticas das internações por causas externas segundo sexo, no período de 2015 a 2024, à luz das construções sociais da masculinidade.
Metodologia
Estudo descritivo, com base critica, utilizando dados secundários, obtidos do Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS), por meio do tabnet/DATASUS, conforme os códigos do capítulo XX do CID-10 (V01-Y98), no período de 2015 a 2024, para o estado do Ceará. Foi realizada análise por meio de estatística descritiva (frequências absolutas e percentuais) da variável sexo, associada a uma abordagem críticas, à luz da saúde coletiva, com enfoque nos marcadores de gênero e masculinidades. A análise considerou as práticas de vigilância, promoção da saúde e na invisibilidade das necessidades direcionadas à saúde do homem para o período analisado.
Resultados
Foram 510.586 internações por causas externas no Ceará (2015 – 2024). Destas, os homens representaram 69,4% (354.569) enquanto as mulheres 30,5% (156.017). A proporção masculina variou de 69,6% em 2020 a 72,8% em 2015. Os homens representaram os maiores percentuais por agressões 89,1% (23.610), acidentes de transporte 78,7% (100.104), destaque para motociclista 82,4% (58.602) e pedestre 70,6% (17.647), lesões autoprovocadas 72,5% (4.867) e quedas 61,3% (101.053). Essa predominância reflete como a masculinidade hegemônica está ligada a determinantes sociais e culturais que negligenciam o adoecimento dos homens, tratando-os sob a ótica biomédica, assistencial e imediata da violência.
Conclusões/Considerações
Os altos índices de internações revelam que os homens são os mais afetados, fato que não pode ser interpretado apenas com valor estatístico, mas como reflexo de uma construção social que negligência e invisibiliza determinantes sociais de gênero. Nesse cenário, o enfrentamento das causas externas requer superar a lógica biomédica, com abordagens criticas e intersetoriais, centradas na defesa da vida e na compreensão do adoecimento masculino.
ISLAMOFOBIA É VIOLÊNCIA: EFEITOS DO RACISMO RELIGIOSO NA SAÚDE MENTAL DE PESSOAS MUÇULMANAS NO BRASIL
Comunicação Oral
1 USP
Apresentação/Introdução
A islamofobia é um fenômeno multidimensional, que se insere em uma lógica colonial que racializa a diferença religiosa. Sendo uma expressão de racismo religioso, representa uma forma estrutural de violência que gera sofrimento e afeta diretamente a saúde mental de pessoas muçulmanas no Brasil, às quais se nega, de forma sistemática, escuta, cuidado e senso de pertencimento.
Objetivos
Objetiva-se expor e analisar os efeitos da islamofobia na saúde mental de pessoas muçulmanas no Brasil, bem como apresentar estratégias de enfrentamento a este fenômeno que começa a ser discutido no país, inclusive em âmbito federal.
Metodologia
Os dados discutidos neste trabalho têm origem na tese de doutorado da autora, dedicada à saúde mental de mulheres muçulmanas, desenvolvida por meio de uma pesquisa participante construída em diálogo com as interlocutoras. Complementarmente, são analisadas informações provenientes do I Relatório de Islamofobia no Brasil, elaborado pelo Grupo de Antropologia em Contextos Islâmicos e Árabes (GRACIAS – FFCLRP/USP), com base em um questionário respondido por mais de 650 pessoas muçulmanas de todas as regiões do país.
Resultados
Os resultados indicam que a islamofobia no Brasil se manifesta de forma estrutural e cotidiana, produzindo efeitos subjetivos e sociais significativos, que impactam a saúde e a cidadania. Relatos de estigmatização, hostilidade, agressões e barreiras no acesso à saúde revelam como a religião opera como um marcador relevante para análise e para o enfrentamento da violência. As micro e macro-violências narradas pela comunidade muçulmana brasileira apontam para o recrudescimento da instilação da retórica de ódio direcionada às religiosidades não-cristãs no país.
Conclusões/Considerações
A islamofobia é uma das expressões obscuras da modernidade/colonialidade vivida por muçulmanos ao redor do mundo, também em solo nacional. A partir da mobilização de certos sinais diacríticos, pessoas muçulmanas são hierarquizadas socialmente: o nexo colonial as associa à barbárie e, ao fazê-lo, fomenta a violência que sobre elas incide. Os dados evidenciam a urgência de políticas mais comprometidas com a diversidade religiosa brasileira.

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