Programa - Comunicação Oral - CO35.1 - Participação social e cuidado em contextos de vulnerabilidade: experiências e evidências
30 DE NOVEMBRO | DOMINGO
15:00 - 16:30
A PRODUÇÃO DO CUIDADO E PARTICIPAÇÃO SOCIAL: A PRÁTICA DE LIDERANÇAS COMUNITÁRIAS FEMININAS EM TERRITÓRIO VULNERÁVEL
Comunicação Oral
Souza, J.B1, Castro-Silva, C.R1, Camilo, C.1
1 UNIFESP
Apresentação/Introdução
Inserida no projeto guarda-chuva “Cuidado na desigualdade social: abordagens interdisciplinares no enfrentamento aos agravos da COVID-19 em território vulnerável”( Processo FAPESP: 2023/05292-1), a pesquisa articula ética do cuidado, a psicologia sócio-histórica e a interseccionalidade como referenciais teóricos para analisar como o cuidado se manifesta como prática coletiva, política e situada.
Objetivos
Este estudo tem como objetivo compreender os sentidos e significados relacionados à produção do cuidado prestado por mulheres que exercem papeis de liderança comunitária em um território de alta vulnerabilidade social no município de Cubatão/SP.
Metodologia
A pesquisa vem sendo desenvolvida na Vila dos Pescadores, bairro localizado no município de Cubatão/SP, onde lideranças comunitárias femininas, sobretudo negras e pardas, atuam como agentes fundamentais no enfrentamento das ausências do Estado, especialmente durante e após a pandemia de Covid-19. A metodologia utilizada envolve revisão integrativa, pesquisa participante e entrevistas semiestruturadas, complementadas por diários de campo, grupos gestores e oficinas. A análise dos dados segue a Hermenêutica de Profundidade (THOMPSON, 2011).
Resultados
Os resultados preliminares apontam que o cuidado realizado por essas lideranças extrapola a dimensão doméstica, constituindo redes de solidariedade e resistência frente às violências estruturais e à negligência do poder público. As ações das lideranças envolvem desde a escuta e acolhimento até a articulação com instituições locais, revelando estratégias coletivas de enfrentamento e sustentação da vida no território. A pandemia evidenciou ainda mais a precarização desses contextos e reforçou o papel dessas mulheres como pilares comunitários.
Conclusões/Considerações
Ao dar visibilidade a essas práticas, o estudo contribui para o debate sobre o tema e também evidencia a necessidade da formulação de políticas públicas sensíveis às especificidades de gênero, raça e classe, com foco na promoção da equidade e fortalecimento da participação social.
EFEITO DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA NA MORTALIDADE DE VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA INTERPESSOAL: UM ESTUDO A PARTIR DA COORTE DE 100 MILHÕES DE BRASILEIROS
Comunicação Oral
Bonfim, C.B.1, Alves, F.1, Barreto, M.L.1, Patel, V.2, Machado, D.B.1
1 CIDACS/ Fiocruz
2 Department of Global Health and Social Medicine, Harvard Medical School
Apresentação/Introdução
A violência interpessoal é um grave problema de saúde pública, com enormes consequências, incluindo o aumento do risco de mortalidade entre os indivíduos expostos. Estratégias para mitigar esses efeitos ainda são pouco conhecidas. Programas de transferência de renda mostram efeitos positivos na saúde da população geral, mas seu impacto entre vítimas de violência interpessoal segue pouco explorado.
Objetivos
Este estudo teve como objetivo testar a associação entre o programa de transferência de renda brasileiro, o Programa Bolsa Família (PBF), e a redução nas taxas de mortalidade entre indivíduos vítimas de violência interpessoal.
Metodologia
Foi realizado um estudo de coorte utilizando dados administrativos de saúde e assistência social vinculados ao baseline da Coorte de 100 Milhões de Brasileiros entre 2011 e 2015. Utilizou-se um método baseado em escore de propensão para balancear a distribuição das covariáveis entre beneficiários e não beneficiários. Empregou-se modelos de riscos proporcionais de Cox para analisar a mortalidade geral e modelos de riscos competitivos para avaliar causas específicas de morte. Estimou-se também a Fração Atribuível Populacional para identificar a proporção de mortes que poderia ter sido evitada caso todas as vítimas de violência interpessoal tivessem recebido os benefícios do PBF.
Resultados
Um total de 29.075 indivíduos foram vítimas de violência interpessoal no período. Mais da metade da amostra (51,11%) recebeu o PBF, com tempo médio de seguimento de 1,71 ano após o evento. Ao todo, 990 indivíduos morreram por causas gerais, a maioria por causas naturais. A participação no PBF esteve associada a uma redução de 18% na mortalidade geral (HR: 0,82; IC95%: 0,70–0,95; p = 0,011) e de 66% na mortalidade por causas naturais (HR: 0,34; IC95%: 0,28–0,41; p < 0,001). O PBF poderia ter prevenido 53% das mortes gerais entre vítimas de violência interpessoal, caso todos fossem beneficiários do programa.
Conclusões/Considerações
A associação entre a participação no PBF e a redução das taxas de mortalidade, especialmente por causas naturais, entre indivíduos afetados por violência interpessoal demonstra que, além de aliviar a pobreza, esses programas têm o potencial de melhorar desfechos em saúde e aumentar as taxas de sobrevivência entre populações vulneráveis.
EXPERIÊNCIAS EXITOSAS NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO DESDE A IMPLANTAÇÃO DO NÚCLEO DE PROMOÇÃO DA SOLIDARIEDADE E PREVENÇÃO DAS VIOLÊNCIAS.
Comunicação Oral
Boscardin, J.R.1, da Silva, G.C.S1, Pires, S. S1, Aguiar, A.R.1
1 Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro/Superintendência de Promoção da Saúde
Período de Realização
de Janeiro de 2024 a Dezembro de 2024.
Objeto da experiência
Qualificar a rede via APS no enfrentamento das violências, com articulação intersetorial e ferramentas para monitorar e acompanhar casos notificados.
Objetivos
Qualificar e articular a rede de saúde por meio da APS; apoiar a formação dos profissionais no cuidado às pessoas em situação de violência; monitorar o acompanhamento dos casos notificados na rede através da ferramenta “Monitor Carioca”; implementar fóruns de rede intra e intersetorial pelo NPSPV.
Metodologia
O NPSPV promoveu seminários e reuniões sistemáticas voltadas para educação permanente aos profissionais de Saúde e da Rede intra e Intersetorial no atendimento e enfrentamento às violências; promoveu a incorporação da ferramenta “Monitor Carioca” ao processo de trabalho das equipes da APS e a implantação dos fóruns de Rede. Tais estratégias apoiam os profissionais no acompanhamento longitudinal das pessoas em situação de violência dos casos notificados, na perspectiva da integralidade.
Resultados
A sensibilização dos profissionais possibilitou o entendimento da importância da articulação e necessidade de compartilhamento do cuidado em rede.
O Monitor Carioca, indutor de cuidado, permitiu que as equipes da APS identificassem as situações de violência, em tempo oportuno, e as intervenções necessárias para elaboração do plano terapêutico singular.
Em 2024, apesar das dificuldades devido às mudanças de território e endereços incompletos, foi registrado um acompanhamento de 41% dos casos.
Análise Crítica
O acompanhamento longitudinal de casos de violência na APS exige profissionais qualificados para essa assistência. Para isso, é essencial construir ferramentas de apoio, fortalecer a articulação da rede e planejamento de estratégias e ações. Destaca-se a necessidade de qualificar o registro de endereço, aprimorar a ferramenta de monitoramento e garantir maior regularidade dos fóruns intersetoriais, favorecendo um cuidado compartilhado e êxito nas experiências para enfrentamento da violência.
Conclusões e/ou Recomendações
Considerando que o enfrentamento da violência é um campo ainda recente no setor saúde e que os profissionais atuam, em sua maioria, na resposta aos agravos já ocorridos, é fundamental promover sensibilização contínua e sistemática, com a devida instrumentalização para que atuem com segurança na identificação, acompanhamento e prevenção dos casos, ampliando o escopo do cuidado compartilhado com a rede intersetorial.
IMPLEMENTAÇÃO DE LINHA DE CUIDADO PARA ATENÇÃO À SAÚDE DE MULHERES, CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E SEXUAL: A EXPERIÊNCIA DE OSASCO
Comunicação Oral
Cerqueira, A. C. G.1, Brasileiro, E. M. C.1, Silva, A. V. A.1, Souza, B. C. F.2, Santos, M. A. B.1, Paulo, N. A. O.1, Pereira, S.3
1 Vigilância Epidemiológica da SMS de Osasco
2 Secretaria Municipal de Saúde de Osasco
3 Vigilância Epidemiológica da SMS de Osasco/FMUSP
Período de Realização
De Abril de 2023 até o presente.
Objeto da experiência
Processo de implementação de Linha de Cuidado (LC) para atenção à saúde de mulheres, crianças e adolescentes em situação de violência em Osasco-SP.
Objetivos
Ampliar o acesso e qualificar o cuidado às pessoas em situação de violência integrando as respostas dos diferentes níveis da Rede de Atenção à Saúde (RAS) por meio de papéis assistenciais e fluxos definidos e fortalecendo a APS com atendimento especializado em Conflitos Familiares Difíceis (Confad).
Descrição da experiência
A LC foi elaborada pelo Núcleo de Prevenção à Violência, composto por gestores da SMS-Osasco, em resultado à análise histórica de dados do SINAN e mapeamento de serviços especializados, que mostrou cuidado fragmentado e pouco efetivo entre os serviços da RAS e baixa articulação com a rede intersetorial. Publicada em 04/2023, está estruturada em três fases: planejamento, intervenção e monitoramento. Desde então, ações foram implementadas para ampliar e qualificar o cuidado aos casos de violência.
Resultados
A implementação da LC foi pouco priorizada entre diferentes níveis de gestão frente a outras demandas assistenciais. Ainda assim, resultou no desenvolvimento de projeto piloto de atendimento especializado (Confad) em uma UBS, na descentralização do cuidado aos casos de violência sexual com a PEP e demais medicamentos profiláticos disponíveis em 100% das unidades de urgência e emergência e no aumento de 397% nas notificações de violência em um ano, articulado à sensibilização das equipes.
Aprendizado e análise crítica
A experiência destaca a relevância da LC na organização de cuidado sensível e qualificado, baseado em decisões assistenciais compartilhadas, intersetoriais e na integralidade da atenção às pessoas em situação de violência. A implementação tem potencial de reduzir a peregrinação, revitimização e fragmentação do cuidado, com fortalecimento da vigilância a partir da qualificação de informações. Porém, a baixa priorização do tema por setores da gestão limita o avanço e a sustentabilidade das ações.
Conclusões e/ou Recomendações
A implementação da LC é um processo contínuo e que demanda o compromisso de todos os níveis de gestão na priorização da violência como um problema, também, de saúde. O fortalecimento e a integração do cuidado na RAS nos parece essencial, especialmente pelo papel de porta de entrada para as redes intersetoriais de garantias de direitos, sendo primordial para diminuir a rota crítica de mulheres, crianças e adolescentes em situação de violência.
RODAS DE CONVERSA COMO DISPOSITIVO DE CUIDADO EM COMUNIDADE RURAL APÓS TRAGÉDIA ESCOLAR NO SEMIÁRIDO BAIANO
Comunicação Oral
Damaceno, S. P.1, Nascimento, J. N.1, Batista, P. L. S.2
1 Espaço Terapêutico Conatus - CONATUS
2 Centro Universitário Pio Décimo - UniPio
Período de Realização
De Novembro de 2024 até Junho de 2025 (atividade em andamento).
Objeto da experiência
Escuta comunitária e rodas de conversa como dispositivo de cuidado frente ao sofrimento psíquico em uma comunidade rural marcada por tragédia escolar.
Objetivos
Criar um espaço coletivo de cuidado a partir de rodas de conversa com moradores de uma comunidade rural do semiárido baiano em resposta ao sofrimento causado por uma tragédia escolar, promovendo escuta, acolhimento e fortalecimento comunitário em território negligenciado pelo poder público.
Metodologia
Após um ataque escolar que vitimou quatro adolescentes em uma comunidade rural baiana, iniciamos uma ação voluntária junto à população local. As rodas de conversa tornaram-se espaço de escuta, priorizando os afetos e singularidades do território. A experiência ocorre em parceria com o Instituto ProBem e o Espaço Conatus. Está em construção um documento para apresentar aos gestores públicos, propondo a continuidade da ação em outras comunidades rurais com contextos semelhantes.
Resultados
As rodas fortalecem vínculos comunitários, promovendo escuta ativa e reconhecimento mútuo dos sofrimentos locais. Jovens, homens, mulheres e lideranças ressignificam suas dores e propõem novas formas de convivência, despertando a comunidade para a importância do cuidado psicossocial coletivo. Além disso, produzem práticas de resistência, ajudando moradores a lidar com adversidades e encontrar saídas possíveis para suas questões, por meio do diálogo e da troca de experiências nas rodas.
Análise Crítica
A experiência evidenciou o abandono histórico das políticas públicas de cunho psicossocial em territórios rurais, a urgência de dispositivos comunitários de cuidado e a potência dos espaços coletivos não medicalizantes. Ensinou que o enfrentamento à violência não pode se limitar a intervenções pontuais, mas deve envolver a escuta continuada, a produção de subjetividades e o enraizamento do cuidado nos modos de vida locais.
Conclusões e/ou Recomendações
A continuidade das rodas é essencial como estratégia de cuidado e produção de atenção psicossocial. Recomendamos que gestores públicos reconheçam práticas comunitárias como estas e as apoiem como política. Além disso, sugerimos que experiências semelhantes sejam replicadas em outros territórios rurais, respeitando suas especificidades e escutando suas vozes, como forma de enfrentamento ético das violências.